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Integrante do board executivo e diretor de eSports da PaiN Gaming, Filipe Makarausky conta as particularidades do cenário competitivo e fala sobre a profissionalização do setor

Ana Carolina

Atuando no mercado há mais de 10 anos, a PaiN Gaming foi fundada em 2010 como time de DotA. Foi a primeira organização de eSports da América Latina a aderir ao formato de Gaming House e é considerada o maior clube da região. A PaiN Gaming foi campeã brasileira de League of Legends em 2013, 2015 e 2021 e, atualmente, também tem equipes na disputa de Counter-Strike: Global Offensive (CS:GO) e Free Fire. Integrante do board executivo, Filipe Makarausky, diretor de eSports da empresa e também ex-gerente de operações de eSports da Riot Games, conta as particularidades do cenário competitivo e fala sobre a profissionalização do setor.

Filipe Makarausky, diretor de eSports da PaiN Gaming (crédito: divulgação)

Meio & Mensagem — O que mudou no cenário dos eSports desde a fundação da PaiN, em 2010?
Filipe Makarausky — O mercado deeSports teve uma revigorada muito forte a partir de 2015. Se formos olhar o início, as competições já existiam em um cenário profissional com Starcraft e CS:GO, lá em 2002, 2003, principalmente na Ásia, mas eram coisas ainda muito novas para o mercado ocidental. Em 2015, a PaiN já tinha um time profissional de DotA e sido campeã brasileira de Lol, mas o mercado ainda era muito imaturo. Eram alguns grupos de amigos que tinham seus times, grupos de pessoas que investiam do próprio bolso, às vezes, até conseguiam patrocinadores em permutas, ou seja, competições por mouse, teclado etc. A partir de 2013, começou a ter um investimento das publishers, de enxergarem eSports como uma ferramenta de marketing para os seus produtos, daí que veio o grande capital investido no nosso mercado. As próprias publishers enxergarem esse mercado e promoverem os seus jogos por meio de competições profissionais. Além disso, em 2015, houve um grande investimento da Riot no Brasil em construir estúdios, contratar pessoas da televisão para montar os produtos de eSports atrativos ao público e focar muito nos times, investindo um pouco e, assim, criando uma rede de entretenimento e um produto vendável para explorar comercialmente por meio de outros patrocinadores. A PaiN acompanhou esse processo desde o começo e foi se estruturando cada vez mais para estar pronta para receber esses investimentos quando eles viessem. Então, a contratação de pessoas não mais ligadas aos jogos, mas sim do mercado, com conhecimento de negócios, de finanças, conhecimentos legais para, de fato, montar a estrutura de equipe e, depois, contratar jogadores. Isso foi muito rápido, de 2015 para cá, faz só seis anos, se formos analisar outros mercados, a evolução não é tão rápida. E com esse produto novo lançado pela Riot, abriram-se outros mercados de jogos. A Garena veio com o Free Fire, que atrai milhões de pessoas. A partir de 2018 as grandes marcas começaram a enxergar de verdade esse público depois que o setor se sustentou e mostrou que veio para ficar.

M&M — Como funciona a profissionalização dos atletas?
Filipe — Para formar um atleta o caminho pode ser visto como em outros esportes, por meio de peneiras, indicações, treinamentos ou encontrando essas pessoas dentro dos servidores dos jogos. Uma vez que esses talentos surgem, tem sempre um direcionamento com a família, um acompanhamento psicológico, nutricional, ou seja, para formá-lo como atleta. Em segundo plano, tem também a questão de que muitos deles já vêm com um público que os acompanha em lives, em algumas redes sociais e é preciso transformar e alavancar a imagem do jogador. Nós formamos esses profissionais sempre focando no desempenho e na capacidade técnica do atleta e, em paralelo, com media training, palestras, para formar ele não só na capacidade técnica, mas também nesses outros atributos que alavancam sua imagem para o mercado. Uma vez que temos esse público, criamos conteúdos com as marcas, com os atletas, patrocinadores ou qualquer produto novo que possa surgir e apresentar numa proposta. Utilizamos essas imagens da PaiN e dos jogadores com engajamento dos públicos para ir mais forte ao mercado.

M&M — Qual é a importância dos patrocínios no desenvolvimento dos campeonatos?
Filipe — Um dos grandes pontos de virada que os campeonatos tiveram foi quando deixaram de receber somente patrocínios de marcas endêmicas entre esportes de mouse, teclado e passaram a ter uma aceitação maior de marcas que estão no mainstream. A Gillete quando entrou em 2018 no CBLol chamou muita atenção porque era um selo da Gillette de que aquilo era um esporte, traz uma maturidade de negócio para o mercado e chama atenção das pessoas que não conheciam eSports, percebendo ‘Nossa, a Gillette está investindo e ela é patrocinadora do Kaká, do Cristiano Ronaldo’, tem uma movimentação do mercado para olhar isso com outros olhos. A Mastercard veio em seguida, também no mundial de Lol. Outras marcas grandes passaram a investir. Assim, sai desse mundo endêmico e cria uma autenticação, uma valorização do mercado para eSports, levando ao público uma imagem profissional. Não é um joguinho, não é uma brincadeira. De fato, os campeonatos têm um peso muito grande, tanto que essas marcas tradicionais já se atrelam a ele.

M&M — Como os modelos de patrocínio evoluíram com o tempo e quais formatos estão em alta no universo do eSports?
Filipe — Vivendo o negócio, enxergo que as marcas que entraram em 2015 não estavam mais conseguindo conversar tão diretamente com o público-alvo de algum dos seus produtos. Eles não mais estavam na televisão, não estavam mais consumindo os mesmos produtos de mídia, uma geração diferente, mais dinâmica, com vídeos on demand, ou seja, é uma geração que assiste ao que quer a hora que quer. Isso não era explorado pelas marcas, mas tinha muita oportunidade também pelo valor de mercado, que, inicialmente, comparado com o valor de televisão e propagandas, era muito mais barato e rentável para conseguir falar diretamente com um público específico que está ali consumindo tal jogo. Teve uma mudança muito grande na mentalidade e na maneira que essas marcas começaram a enxergar novas ferramentas para chegar no seu púbico. O trabalho foi criar produtos, massa de dados, para provar e mostrar para o mercado onde estava esse novo público, o que ele consome, como poderíamos atingi-lo. Foi um trabalho em conjunto com as marcas para mostrar essa fatia e gerar mais negócios. Em formatos de patrocínio, o que está mais em alta no modelo de engajamento e que o público mais gosta é a fatia que mais conseguimos explorar: a geração de conteúdos envolvendo a marca. Não necessariamente só estampar um patrocínio numa camisa, mas também fazer atividades que envolvam os produtos, mostrem as marcas no dia a dia dos atletas, dos influenciadores e gere conteúdo que possa ser consumido durante bastante tempo, que fique permanente na rede ou que que gere mais engajamento do público.

M&M — Como vocês projetam o futuro do setor?
Filipe — Nós estamos em um momento de crescimento. Ainda existem muitas oportunidades para as marcas usando a imagem dos jogadores. É crescente. Com relação aos torneios e às publishers, o calendário de eSports vem aumentando bastante, o que chama atenção e é muito interessante paras marcas, porque um dos problemas de League of Legends no Brasil ou até mesmo Free Fire é que tem um ciclo que termina muito rapidamente; você não tem algo que permeia o ano inteiro. Então, a partir do momento que temos outras modalidades surgindo, conseguimos criar entregas mais sustentáveis no decorrer do ano todo. Se formos analisar os novos jogos que foram lançados nos últimos dois, três anos pela Riot, pela Garena ou pela Moonton, a concepção do jogo já tem a ideia de que ele precisa ser competitivo, de alguma forma, já nasce com essa visão. Assim surgiu o TFT, na Riot; agora o Mobile Legends, na Moonton; o Free Fire, com a Garena; eles já nascem com os cenários de competição acoplados a eles. As próprias publishers, donas dos jogos, já veem esse potencial de entrega, de marketing e de desenvolvimento com o mercado. Tudo acontece muito rapidamente em eSports.

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